Foi
a altura certa para fazer as malas e sair, duma vez por todas, daquela casa
onde já nada a prendia, a não ser a memória do que haviam sido e as súplicas
incessantes de Diogo para que não partisse.
Sofia
não aguentava mais permanecer naquela relação estagnada, onde não tinham mais
para partilhar, para dar um ao outro, onde as discussões eram constantes,
alternadas com os amuos silenciosos de Diogo, que se queixava sempre que Sofia
já não o amava, sem se aperceber que também ele já não sentia amor por ela,
apenas estava preso pelo hábito.
Sofia
deitou um último olhar ao apartamento vazio, aquele para o qual lhe custava
cada vez mais voltar ao fim do dia, adiando o regresso sempre mais um pouco,
mais uns minutos no trabalho, mais uma aula no ginásio.
Sentiu
de novo o aperto no estômago dos remorsos, aproveitar a viagem de negócios de
Diogo para se libertar era um ato cobarde, bem o sabia, mas também sabia que
era a única forma de o fazer acontecer, porque quando começavam as súplicas
ficava incapaz de agir, não pelo presente ou por perspetivas de futuro, mas
pelas memórias da vida comum e dos sonhos que tinham partilhado, agora
estilhaçados pelo chão e que teria que pisar para sair, ainda que por isso
tivesse que se ferir e sangrar.
Pegou
nas malas que continham apenas aquilo que lhe pertencia. Os objetos comuns
ficavam, já iria haver discussões suficientes sem que tivessem que decidir quem
ficaria com a coletânea dos Queen.
A
chave ficava em cima da mesinha, com uma carta cuja redação lhe custara horas
de escrita, rasgar de folhas e choro.
Quando
bateu a porta, as lágrimas recomeçaram a correr, mas nem Sofia seria capaz de
dizer se eram de tristeza ou de alívio.
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