28/03/2016

Destino

“O destino, isso a que damos o nome de destino, como todas as coisas deste mundo, não conhece a linha recta.” *
Avança com curvas e contracurvas, num percurso sinuoso, que às vezes parece que anda para trás em vez de ir em frente, seguindo os seus inexoráveis desígnios. Ou seguirá o rumo que lhe damos, consciente ou inconscientemente?
Seja algo que criamos ou algo que nos é dado, não é nunca uma linha reta, é um caminho tortuoso, com silvas que é preciso desbravar, e pedras e buracos onde tropeçar. Mas é também tantas vezes um caminho por um vale verdejante, ladeado por campos floridos, em que há sol, borboletas e pássaros a cantar.
Mais à frente podemos ter um bosque sombrio, de árvores quase fechadas sobre si, que amedronta atravessar. E aí às vezes há difíceis decisões a tomar: atravessar o bosque assustador, parar ali ou procurar um caminho alternativo, ainda que mais longo e mais duro.
Podemos culpar o destino se tivemos medo do bosque e parámos? Ou apenas se o atravessamos e formos atacados por lobos ou ladrões? Ou será o destino independente das nossas decisões e qualquer que seja o caminho que escolhemos leva-nos ao mesmo sítio? Ou será mutável com as nossas decisões, mas independente delas, abrindo a porta ao conceito de universos paralelos?
É confortável ter algo que culpar se a vida não corre bem. Foi o destino que nos juntou, foi o destino que nos separou. Foi o destino que nos levou para aqui ou para acolá. Foi o destino que matou os nossos entes queridos, naquela hora. Mas o destino também colide com o livre arbítrio de que somos dotados.
Por isso, quanto da nossa vida é responsabilidade nossa, dos nossos atos ou omissões, e quanto depende de algo que nos ultrapassa a todos e que não podemos compreender, apenas saber que anda por linhas tortas?


* José Saramago, in "Cadernos de Lanzarote"

Sem comentários:

Enviar um comentário